quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Sai o 7° livro "Jovens Anos, Belos Dias" do jornalista Xico Júnior

Livro "JOVENS ANOS, BELOS DIAS", sétimo livro de autoria do jornalista XICO JÚNIOR, estará à disposição dos interessados a partir de 21/08/2012.
A partir do próximo dia 21 de agosto de 2012 o sétimo livro do jornalista FRANCISCO ANTONIO PAGOT (Xico Júnior) , JOVENS ANOS, BELOS TAMPOS, com 233 páginas, estará à disposição dos interessados via e-mail: la-stampa@ig.com.br ou pelo fone: (51) 3472-6666. Esta obra literária tem uma tiragem limitada: portanto, os interessados e os que têm curiosidade de saber como viviam os canoenses nas décadas de 50, 60 e 70 terão pouco tempo para se decidir.

Esta nova obra do jornalista canoense trata de um rebuscado dos anos 50, 60 e 70, e conta uma parte da história de Canoas e de como a gente canoense vivia naquelas décadas, tudo em ritmo de narrativa em estilo coloquial.

Será, para muitos que viveram aqueles dourados e diamantinos anos, um achado memorável, usando a expressão "lugar-comum", uma verdadeira viagem ao túnel do tempo, saudável, de reencontro com as lembranças do tempo mais rico, participativo e borbulhante da vida de Canoas e sua gente.

São fatos e atos nunca antes relatados ou registrados em livro por nenhum escritor canoense, por isso o sei ineditismo, a exclusividade das fotos e dos fatos.

Contatos - E-mail: la-stampa@ig.com.br
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sexta-feira, 28 de maio de 2010

21 de abril de 1960: nascia a Nova Capital Brasília e o Esporte Clube São José

OBS: Na foto acima vê-se ao fundo a casa da família de Arnaldo e Dora Ren, onde, em uma casinha de madeira muito bem conservada, cedida pela nossa maior e mais entusiasta incentivadora, a "dona" Dora, funcionava a sede do Esporte Clube São José. E era a própria "dona" Dora quem, espontaneamente, se dispunha a lavar as camisetas, calções e meias dos dois times (isso que à época não tinha ainda a hoje conhecida máquina de lavar) que formavam o Esporte Clube São José, nome que não lembro de onde ou como e nem por quem foi inspirado.


Pois, exatamente no dia em que o Brasil assistia a inauguração da "novacap" Brasília, em 21 de abril de 1960, construída na gestão do então presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, nós jovens adolescentes, moradores da Rua Frederico Guilherme Ludwig, inaugurávamos o Esporte Clube São José, time de futebol de salão. O clube tinha, digamos, a sua própria cancha, em terreno cedido gentilmente pala Família Mencky, construída num terreno em declive situado nos fundos da casa da família Ren (que era a nossa passagem). A cancha, que era em terreno em declive, foi consturída e nivelava em sistema de mutirão, com a participação da maioria dos jogadores que pertencia ao E. C. São José e do Real Futebol Clube, nosso principal adversário, integrado por João Alberto Wütrock (o Joãozinho Mandolate, goleiro), os irmãos Manoel Airton, Jaclém (o Jáco) e Whinigton (o Teca), o mano Osmar Pagot (o Toruca), os também irmãos Neca e Kidi e Vanderley Mahfuz (o Piquinho), que, com picaretas, enxadas, pás e carrinhos-de-mão conseguímos nivelar o terreno e assim termos a nossa própria e exclusiva cancha de futebol de salão, hoje futsal. Muitos outros não participaram ativamente, pois moravam longe e só podiam participar dos jogos nos domingos.

INAUGURAÇÃO DA CANCHA COM TIRO DE CANHÃO


A inauguração da cancha, cuja partida foi realizada entre o Esporte Clube São José X Real Futebol Clube, obviamente, teve um lance simplesmente surpreendente, inesquecível e sui generis: o "seu" Hans Wütrock, mesmo com sério problema de saúde, era um habilidoso e detalhista artesão, e assim construía miniaturas de navios e aviões com os mínimos detalhes que pareciam demais com os grandes que participaram da II Guerra Mundial, da mesma forma que canhões. E foi com um desses, que atirava bombas de verdade, porém em miniatura, que ele deu o "tiro inicial" em lugar do tradicional "ponta-pé inicial", inaugurando a novíssima cancha. Sem dúvida, os aplausos e a ovação foi unânime e a partir disso a alegria e o entusiasmo tomou conta da turma de atletas e do grande número de pessoas, entre familiares e amigos, que foram conferir o feito e prestigiar o evento esportivo. Daquele dia em diante havia sempre um significativo número de pessoas: casais, adultos, adolescente e crianças, prestigiando os nossos jogos e torneios, como o que foi conquistado pela equipe "B", do Esporte Clube São José, em 1960. Tanto que, para conseguirmos receita para a compra das camisetas, calções, meias, guides (hoje tênis) e bolas, montávamos um bar-lancheria, com o balcão feito de tábua em formato de "L", dotado de refrigerantes e doces e fatias de bolos que eram oferecidos pelas mulheres de "A Minha, Nossa Rua", que se cotizavam para que nós vendéssemos e assim angariássemos receita para o clube, além de termos realizado o concurso, através de venda de votos, para a escolha da Rainha do Clube, cuja eleita foi Neusa Bernardes, que rendeu bom resultado financeiro e serviu muito à compra dos fardamentos das equipes "A" e "B" do São José. Lembro como se hoje, quando chegaram os primeiros fardamentos: foi como se uma alegria indígena, bem ao estilo do tempo de Cabral, quando recebiam espelhinhos. Uma festa e uma comemoração singular.

A divisão em dois times provocou uma divergência entre o então presidente do clube, Hugo Ren e o vice-presidente e técnico Francisco Antonio Pagot, na escalação dos times "A" e "B". Assim, depois da polêmica, ficou acordado que Hugo se encarregaria, com prioridade na seleção dos jogarores, de escolher os que formariam no time "A", enquanto que os que restassem formariam o time "B", sob a orientação do Chico. Antes do Chico (Xico Júnior) ser o técnico, quem treinava e escalava o time era José Guerra que, devido a uma polêmica gerada com o presidente do clube, Hugo Ren, acabou se demetindo, assumindo em seu lugar o Chico, como técnico e jogador.

O time "A" tinha, entre outros, o próprio Hugo atuando de zagueiro fixo, José Henemann como goleiro, Luiz Fernando Loureiro e Nelson Ren, pelas laterais e Bruno Pagot jogando na frente, como atacante. Já o time "B" tinha como goleiro Antônio Fogaça, Carlos Gilberto Fernandes de Vargas (o Giba) como zagueiro fixo, Ademir D´Arrigo (o Polenta) e Chico (Xico Júnior) pelas laterais e Felipe Collares jogando à frente, como atacante, enquanto que Odir Bertoletti era o reserva substituto.

O primeiro e único torneio realizado com a participação de dois times do Esporte Clube São José: equipe "A" e "B"; duas equipes do Real Futebol Clube "A" e "B": João Alberto Wütrock (o Joãozinho), os irmãos Guerra: Manoel Airton e Jacém (o Jáco), os irmãos Neca e Ki, Osmar Pagot (o Toruca) e Vanderley Mahfuz (o Piquinho); o Esporte Clube Coimbra, formado pelos irmãos Possebon (Luiz Antônio, Beto, Zezo, Sérgio e os primos Pazetto (Paulo e Chiquinho) e mais o Independente, este formado pelos irmãos Balbinot (Antenor, Valmir, Renato e Walter (o Guinga) e mais o "Vaqueiro". Sagrou-se campeão invicto, a equipe "B" do Esporte Clube São José, com a formação conforme documenta a foto acima.

Esse blog, representa também, uma homenagem à saudosa "dona" Dora que, além de incentivar e apoiar a turma e a formação do Clube, nos domingos à tardinha, já anoitecendo, logo após os jogos, oferecia a sua área nos fundos da sua casa, parte térrea, com piso recoberto de cimento queimado com toque de pintura avermelhada para que realizássemos os nossos bailinhos, com toda a turma do futebol e as meninas da "A Minha, Nossa Rua", animados com "bolachões" em vinil, que ela fazia rodar na vitrola. Músicas dos cantores da Jovem Guarda eram raras, mas a coleção de LPs, (Long Plays em vinil), com tangos, boleros, guarânias, rumbas, baladas era bastante mais ampla. Assim, lembro que a primeira música que dancei na minha vida foi o tango "Cinzas do Passado", composição de Cláudio de Barros e interpretado pelo cantor de tangos Albertinho Fortuna, que vai postado abaixo.
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Hoje, com o advento da internet, os amigos distante se tornaram mais próximos, e os mais próximos se distanciaram.

domingo, 2 de dezembro de 2007

A Minha, Nossa Rua

Passei dia desses pela "minha rua"! Tão diferente de minha rua de outrora, a rua de minha infância, onde corria solto e sorria feliz nas brincadeiras de menino pobre de um quase bairro. Rua que viu surgir meus primeiros sonhos de adolescente, que acolheu minhas primeiras lágrimas de desencanto, rua que viu chegar minha primeira namoradinha, que me viu desabrochar para o amor da mulher que seria a mãe de meus filhos, a companheira de uma jornada de tantas décadas, enfim, a minha rua ... A minha saudosa rua Frederico Guilherme Ludwig.
Começava na Rua Dr. Barcelos e se estendia até a Rua Brasil, mas só considerávamos nossa rua aquelas três ou quatro quadras, porém sem demarcação. Não havia cruzamentos, que poderia passar a idéia de um tipo de divisor de águas. Para além da esquina, pouco notávamos a sua existência. A vida, na sua grande parte, acontecia naquele pedacinho de rua, num trecho de trezentos ou quatrocentos metros, pelo menos para nós. Fecho meus olhos e ainda vejo o armazém do "seu" Nilo (Graebin), na esquina da rua Dr. Barcelos, com sua Rural Willys que servia às compras juntos aos atacadistas ou, nos finais de semana, ao passeio da família e amigos.
Ainda em setembro de 2007 lá estava, um tanto descuidado e solitário, o cinamomo que dava sombra aos que usavam a rústica mesa para a cervejinha gelada e o jogar conversa fora, armada sob seus protetores galhos. Em 2009 o João Gilberto Graebin, que assumiu o Armazém e o transformou, depois, em ferragem, mandou arrancar o tradicional cinamomo que, sob seus galhos e folhas, guardava tantas histórias e lembranças, que, quanto possível, vou resgatando nesse trabalho.
Do outro lado da rua, em frente à minha casa, o sítio da família Mencky, repleto de árvores frutíferas, exalando o doce perfume que aguçava a gula, também fazendo esquina com a Dr. Barcelos. Eram caqueiros, bergamoteiras, laranjeiras, goiabeiras, limeiras e amoreiras em abundância. E lá havia um cipreste, ou pinheiro-do-canadá, de gênero exótico e ornamental, dotado de ramículos verde-amarelados, escuros, densos e plumosos, verticalmente exuberante. E lá quase no topo, o mano Osmar construiu uma "casinha", com tablado de madeira e ripas cercando o mirante e tudo fixado com grossos e longos pregos para evitar prossíveis quedas, o que seria fatal. O risco maior era no subir ou descer apoiando-se nos grossos e fortes galhos que estendia à ornamentação daquele exuberante pinheiro-do-canadá. Lá do alto do mirante podíamos, com total exclusividade, apreciar vistas panorâmicas dos diverso ângulos da cidade, admirável de se ver, quando sobressaia-se a torre da Igreja Matriz São Luís Gonzaga, o centro da cidade, as vilas (hoje promovidas a bairro) Harmonia, Mathias Velho, Fátima, o V Comar e até a Base Aérea. O observatório, sustentado pelo terraço, nos proporcionava, enfim, um largo, indiscritível e infinito horizonte.
Nos fundos à nossa casa, outro sítio, ainda maior, também pertencente à família Mencky, onde, entre árvores frutíferas aos mangotes, criavam algumas vacas leiteiras. Alí tinham o tambo, a cocheira e diariamente tiravam o leite das vacas. Esse sim bem nos fundos de casa, com acesso pela rua Dr. Barcelos e que se alargava até a rua Brasil, que era uma ruazinha um tanto feia pelo desuso, ladeada pelo matagal que surgia célere, e praticamente desabitada. Naquela área ficava a leiteria dos Mencky, depois explorada pela família dos pais da Helga e do Hildebrando, onde, diariamente, à tardinha, meus irmãos e eu, assim como a Neusa e a Neiva Bernardes, íamos de copo na mão, com chocolate em pó dentro, tomar nosso leite vitamindamente achocolatado. Leite que vinha da fonte natural, direto do ubre da vaca para o copo. Apenas passávamos a cerca de tela que havia nos fundos de casa.
Na Dr. Barcelos, em frente à rua Frederico Guilherme Ludwig ficava o sítio da família do médico Victor Hugo Ludwig e dona Iracema, com os filhos Paulo Armando (médico pediatra) e Rubem Carlos (general do Exército, que no longo e decano período da "ditadura fardada" ocupou três pastas ministeriis: Educação, SNI - Serviço Nacional de Informação e Chefe da Casa Militar do presidente da República). Ao lado, fazendo divisa, uma grande área que pertencia à Vifosa, também chamada de "fábrica de vidro". Não foram poucas as vezes que nos embranhamos, aventureiramente, mato adentro. Parecia não ter fim de tão espesso e grande.

Era no Armazém do "seu" Nilo (Graebin) onde comprávamos, além do pão nosso de cada dia, feijão, arroz, açúcar, batata e os demais produtos à necessidade da culinária do dia-a-dia, assim como doces que nos deliciavam e pareciam os mais maravilhosos do mundo e as balas com figurinhas para os álbuns, em especial, sobre jogadores de futebol.
Os picolés que provávamos, de vez em quando, eram caseiros e feitos com capricho, vendidos por passantes que empurravam seus carrinhos lomba acima, lomba à baixo.
Os sorvetes que comíamos eram quase sempre comprados no centro da cidade, ora de chocolate, morango, creme ou de pistache, e um fantástico "kibon" e "chika-bon" - sorvete-picolés envolvido em uma casca de chocolate meia crocante, especialidades que satisfaziam pela delícia e refrescavam nosso verão.
Rua de tantas histórias, de tantos acontecimentos, de tantas esperanças, de tantos pregões.

Sobre os que eram doces e alegravam minhas tardes, já lhes falei. Falo agora dos que traziam soluções nas mãos de hábeis "remendões" como o funileiro que passava uma vez por semana para consertar as panelas de alumínio, tampando com pedacinhos de solda os estragos que o fogo e o tempo faziam no metal; ou o amolador de facas e tesouras, que vinha soprando uma espécie de apito com escala musical; o guarda-chuveiro que, com maestria, trocava as varetas que o vento se encarregara de quebrar; o vidraceiro que substituía os vidros que os garotos tivessem quebrado com suas boladas ou com alguma pedrada que "sem que eles soubessem por quê, nem como", os tivessem partido.
Enfim, todo um plantel de serviços à porta de casa, sem contar com o "turco da prestação" - foi o primeiro "patrício" que conheci e o único que lembro exatamente do seu nome de origem, Hassan H. Abouhadba, ou para a maioria simplesmente Jorge, que no decorrer do tempo ficou meu amigo -, que, inicialmente, passava com sua pesada e estufada mala numa mão e uma porção de gravatas, lenços e afins pendurados na outra, subindo pelo braço e que, num português difícil de entender, oferecia às donas de casa a oportunidade de "combrar" tecidos, toalhas, enfim, o que precisassem, mesmo porque, se não os tivesse, bastava encomendar que ele traria na semana seguinte, para pagar um "boquinho pro semana", num prazo a perder de vista. Mais adiante o "patrício Jorge" comprou uma bicicleta, cuja mala transportava no porta-pacotes que ficava na parte traseira do "veículo" pedalante. Na subida, até para poder bater de casa em casa, ele empurrava, equilibrando a bicicleta e a mala estufada de utilidades para o lar e atavios no porta-carrona.

Rua que se enchia de alarido nos finais de tarde, quando a criançada, terminado o turno escolar e feita a lição de casa, juntava-se para as brincadeiras. As gurias formavam grupinhos para trocas de segredinhos e confidências e preencher os "diários, então uma mania, e os rapazes, nas esquinas ou próximo a elas, ficavam espichando olhares numa tentativa de paquera, nem sempre frutífera, já que as meninas preferiam encontrar príncipes em outras plagas, garotos que elas considerassem mais interessantes, que trouxesse a magia do desconhecido a ser revelado ou descoberto. Tão certo, que nenhum rapaz da "minha, nossa rua" casou com alguma guria que lá tivesse morado. E mais para a noite, terminado o jantar, os homens colocavam cadeiras nas calçadas para um descontraído bate-papo entre vizinhos, juntando-se a eles, depois de arrumada a cozinha, suas esposas, numa conversa amigável que ia até lá pelas nove da noite, ou um pouco mais tarde se a noite fosse de verão, quente demais para dormir. E, quando em convescotes à tarde, sorviam o mate-amargo ou chimarrão, e as mulheres, entre as trocas de opiniões e confidências, sorviam o mate-doce (chimarrão incrementado por alguma erva saudável e adoçado com uma colher de mel puro, que se diluia com a adoção da água quente, quase fervendo, fazendo com que a bomba queimasse os lábios e a água a língua), enquanto que ao mesmo tempo, e sem perda de tempo, tricotavam (inclusive sobre a vida alheia, até porque naquela época também ninguém era de ferro), bordavam e faziam crochê.

Em razão da erosão provocada pelas chuvas, o leito da rua de chão batido tinha verdadeiros sulcos (fendas), que impediam o rodar normal dos próprios veículos, mas nem isso estorvava que brincássemos com nossos patinetes, carrinhos de lomba, andar de bicicleta, carrinhos de lata, rodinhas de gancho ou guia do aro, etc.

Ah, a chuva! Como era gostoso, um prazer incalculável e ansiado, quando chovia forte e demorado, e que as nossas mães permitiam que se tomasse banho de chuva. As valetas nas laterais da rua enchiam de água e era exatamente alí que dávamos preferência para, descalços, andar por entre a água barrenta. Os calções, esses geralmente feitos artesanalmente pelas nossas mães (não tinha essa de ir na loja e comprar pela etiqueta ou griffe que o modismo passou a "fazer a cabeça" da gurizada de hoje), ficavam uniformemente enlameados. Depois, em casa, íamos para o tanque de cimento onde se lavava a roupa, cheio de água limpa, mergulhávamos acocorados para retirar o grosso da lama do corpo e dos calções. Era, como se diz hoje, um verdadeiro "festerê", uma alegria quase indígena.

Era lá no topo da rua, em frente as casas das famílias Simon e Droescher que a turma se reunia, sentada ou recostada no muro ou quando para o jogar uma pelada, bola de gude, chincha, taco, ou para brincar de esconde-esconde, pega-pega ou, ainda, de "passar o anel", aí com a participação das meninas. A gente dada um dedo, uma mão para estar lá, comunitariamente, com o grupo amigo até 23 horas ou meia-noite.

Não foram raras as vezes em que nos reuníamos com a Margarida na área da casa do casal João e Rosa Venhofen, junto com as outras gurias da "Minha, Nossa Rua" e alí jogar conversa fora. E lá pelas 22 ou 23 horas vinha a "dona" Rosa, educada e sutilmente, e dizia: "Margarida! Vem prá dentro que os rapazes querem ir dormir". E lá íamos todos cada um prá sua casa.

Rua que se cobria de respeito nos momentos difíceis, que se engalanava nos dias de festa em perfeito clima comunitário. Rua que congregava vizinhos que eram mais que isso, que eram amigos com quem se poderia contar em qualquer ocasião. Rua que mora nas minhas recordações, que trago no meu coração e que ao visitar me enche de nostalgia e tristeza ao pensar que seus atuais moradores nem de longe podem imaginar as doces lembranças que pairam no ar, entre as calçadas descuidadas, em cada pedra daquela rua de chão-batido, em cada canto da minha rua de aparência desorganizada.

Alí próximo, nos fundos do sítio da família Ludwig, que dava para a rua Dr. Barcelos, morava a família Pinto, com os três filhos: Adão Rosende (que trabalhou anos a fio no Cartório e tempos depois foi vereador), o Zeca (José), que se suicidou ao mergulhar um avião contra um hangar da Varig, no Aeroporto Salgado Filho no final dos anos cinqüenta, e a irmã deles, que era amicíssima da minha irmã Natalina e ambas trabalhavam na Casa Arthur Vargas, de propriedade do "seu" Arthur Pereira de Vargas, família tradicional e influente na cidade.

Um tempo, e também por isso dá uma baita saudade, em que os casais colocavam as cadeiras nas calçadas e ali acomodados, sem pressa, matavam o tempo em conversas descompromissadas, lembranças e relembranças, trocas de experiências, e iam construindo quimeras sem que se dessem conta e preservando a história sem se darem por consciência. Era gente que compunha a própria paisagem da rua, da cidade, da vida, como monumentos de vultos humanos reais.

É muito agradável ter uma rua que nos diga "como é bom ser livre, mas pertencer". E, hoje, nos resta muitos questionamentos, como: Onde pertencemos? De onde somos? A resposta poderá ser "somos de onde fomos felizes".
E esse tempo de sermos felizes, para nós adultos nostálgicos, houve lá pelas décadas de cinqüenta, sessenta e até setenta. Tempo em que o humano solidário existia de fato, sem a máscara de Tartufo (a personagem de Molière, que retratava à perfeição a hipocrisia). Uns ajudavam os outros. Uns acudiam os outros. Uns eram amigos atestados dos outros. Ninguém ficava solitário com seus problemas. Havia como que uma cumplicidade de amigos, uma comunhão em convivência.

Um tempo em que não haviam a enxurrada de hipócritas ações mascaradas de solidariedade, de sentimento de humanidade, como asilos, onde os filhos jogam os seus velho pais, ascendentes rejeitados e desumanizados. Não haviam "casas do pequeno trabalhador" para meninos abandonados pelos pais e pela sociedade, abrigos para mendigos e nem mendigos dormitando em calçadas, como animais sem espírito, sob as abas das marquises. Não haviam, sequer, marquises. Não haviam sequer pedintes, crianças e adolescentes abandonados.

As casas, em sua grande maioria, simples. De madeira, com os poucos e necessários cômodos: sala, cozinha, dois, três ou quatro quartos, dependendo do número de filhos. Fogão à lenha e algumas poucas casas, dos que podiam um pouco mais, dotadas de fogão à gás. Uma área na parte fronteira e, em alguns casos, uma nos fundos, onde ficava o tanque de cimento para lavar a roupa e abrigar-se quando em dias de chuva. Serviam até para a roda de mate-doce (chimarrão com algumas ervas e uma colher de mel puro) para o convívio das mulheres, vizinhas, parentes, amigas. O café da tarde, mais do que um hábito, uma tradição, era servido na cozinha, com pão feito em casa, mel, chimias (geralmente preparadas em casa em tachos de cobre), salame, queijo ou então a rodada de café com bolinhos de chuva. Primeiro era servido a gurizada. Livres do tumulto, as mães aí sentavam-se tranqüilas, serenas e, entre goles de café e bolinhos de chuva, punham em dia os assuntos que eram só delas.

Ah, a turma tinha tantas opções: futebol de campo, de salão (mesmo que em campo de gramado ou areião feito a picão, enxadas e pás) ou no meio da rua; caçar passarinho de funda feitas artesanalmente; pescar peixes ou muçuns com caniço de taquara e anzol; construir espingardas que atirassem de verdade, carregada pela boca com pólvora e chumbinho (nessas duas últimas tarefas, que eram suas especialidades, ninguém batia o mano Osmar). Ele era exímio na criação de espingardas, as coronhas pareciam produzidas industrialmente de tão bem feitas e acabadas. Chegava à perfeição. O cano de aço, a carga de pólvora e chumbo que atingiam grande alcance.

Além disso, brincadeiras, como cobra-cega, esconde-esconde e os diferentes jogos com bolinha de gude, soltar pandorga, jogo da chincha valendo figurinhas, maços de cigarros ou tampinhas de garrafa, e diversos outros, além das rodas e brincadeiras que incluiam as meninas, como no jogo de "passar o anel". Aí valia abraços, beijos na testa, na face e até esporádica e atrevidamente um "selinho" nos lábios.

Até guerra com funda carregada com bolotas de mamonas, com um grupo camuflado com máscaras em cima do telhado da estrebaria dos Mencky, e os outros nos chão, protegendo-se atrás de cinamomos, eucaliptos e outras árvores. Só não valia dar a volta e apanhar os que estavam sobre o telhado por trás. Para os que estavam sobre a estrebaria valia proteger-se com máscaras de papelão. Mesmo assim, um que outro aparecia com um olho ou o rosto inchado.

Havia a disputa de quem conseguisse colecionar mais figurinhas e as mais difíceis para os álbuns de jogadores, de artistas, personagens de revistas em quadrinho. A disputa das coleções de carteira de cigarro, de flâmulas, de chaveiros (ainda aqueles bem simples, primitivos, sem muita sofisticação) e até de bolinhas de gude, com desenhos ou efeitos raros. Os torneios de futebol de mesa ou jogo de botão, ora na casa de um ora de outros.

E as bicicletas, nem tão comuns por caras. Os que tinham as decoravam com aparadores de barro nos pára-lamas dianteiro e traseiro, evitando o respingar do barro na roupa, e dotadas de espelhinhos retrovisores presos ao "guidon" com o emblema do time da preferência ou o "motorzinho" (ra-tá-tá-tá-tá-tá) feitos de papelão ou fino fio que roçava nas hastes dos aros das rodas quando em andamento. Até cataventos, feitos de papelão, se colocava à frente da bicicleta. Era um deleite vê-los girando ao andar contra o vento. Para quem quisesse mais conforto no sentar colocavam sobre o celim da bicicleta uma capa almofado, na maioria das vezes com o distintivo do seus clube de preferêndia: Inter ou Grêmio.

Hoje a gurizada brinca na Internet. Um brinquedo mais moderno e que proporciona mais opções de jogos e torna a comunicação mais rápida. Mas a quem interessa isso? Ao pobre? Aos que moram em bairros ou vilas sem água, sem luz, sem esgoto, sem estrutura e sem qualidade de vida? Ou será que tal processo, originado pela globalização capitalista, não foi projetada com outros viés subliminares? A gurizada do final do Século XX e do início deste Século XXI é teleguiada, sem personalidade e, sob o ponto de vista da qualidade de vida propriamente dita, infeliz, posto que todas as ações que lhes são oferecidas os colocam trancafiados em quartos, salas ou recintos sem oxigenação e com ar artificializado. Pode ser, hoje, uma questão de status, mas não mais salutar que o ar natural, que batia suave em nossos rostos. A juventude deste Século 21 não têm a opção da criatividade liberta e até compulsória.

Assim, de certa forma, tornou-se revoltada por oprimida, por pressionada e limitada na sua liberrade tão necessária e fundamental à formação de qualquer se humano, racional ou irracional. Trancafiaram-na. Amputaram-lhe o poder de criação. Muraram o seu espaço, e assim, roubaram-lhe a liberdade. Substimaram-na quanto à sua capacidade e responsabilidade de criar e produzir, de inovar e construir a sua própria vida. Assim, passara a confrontar-se, derrubando conceito, preconceitos e tabus em busca do seu espaço, da sua liberdade e da necessidade de mostrar-se criativa e capaz.


Nestes tempos ditos modernos, nos defrontamos com os "conflitos de gerações". E sobre isso o médico inglês Ronald Gibson começou uma conferência citando quatro frases, claro que nem todas tão expressivas quanto uma verdade inconteste e completa, além dele próprio expor o seu indisfarçável preconceito:
1ª - "A nossa juventude adora luxo, é mal-educada, despreza a autoridade e não tem o menor respeito pelos mais velho. Os nossos filhos hoje são verdadeiros tiranos. Eles não se levantam quando uma pessoa idosa entra em casa, não cedem lugar nos ônibus ou trem, respondem com rispidez aos pais e são simplesmente maus".
2ª - "Não tenho mais nenhuma esperança no futuro do nosso país se a juventude de hoje tomar o poder amanhã, porque essa juventude é insuportável, desenfreada, simplesmente horrível".
3ª - "O nosso mundo atingiu seu ponto crítico. Os filhos não ouvem mais os pais. O fim do mundo não pode estar muito longe".
4ª - "Este juventude está estragada até o fundo do coração. Os jovens são maus e preguiçosos. Eles nunca serão como a juventude de antigamente ... A juventude de hoje não será capaz de manter a nossa cultura".
Após ter lido as quatro citações, ficou muito satisfeito com a aprovação que os espectadores davam às frases. Então revelou a origem delas:
A primeira é de Sócrates (470 - 399 a.C.). A segunda de Hesíodo (720 a.C.). A terceira de um sacerdote do ano 2000 a.C. e a quarta e última estava escrita em um vaso de argila descoberto nas ruínas da Babilônia e tem mais de 4.000 anos de existência".
Será, fico a pensar diante de um quadro comportamental que vem evoluindo ou através de movimentos progressivos (ou seria resultante de um processo involutivo de suas formas, procedimento e instituições e das suas funções sociais?) a cada século, a cada ano, a cada dia, que isso é qualidade de vida ou apenas evolução tecnológica que vem tornando as pessoas cada vez mais robotizadas? Naquela "Minha, Nossa Rua", não se sabia o que era estresse, depressão, crise de angústia e de ansiedade. Não se tinha conhecimento, se é que existiam, os soníferos, calmantes, antidepressivos, ansiolíticos, etc. Não havia, e sequer se pensava, as academias de ginástica para deixar o "corpo mais sarado". Isso mais uma questão de estética, aparência e uma vaidade pessoal massificada insistente e exaustivamente pela chamada grande mídia.
Ainda com a evolução da tecnologia e o surgimento da Internet, do telefone celular e, como conseqüência, a falta de privacidade de cada indivíduo, sem falsos ou exagerados saudosismos, prefiro aquele tempo que poderá, para a grande maioria, parecer o "tempo em que se amarrava cachorro com lingüiça" ou o "tempo da pedra lascada", porém mais livre, com mais espaços e mais ... muito mais feliz.


Ah! Haviam homens e mulheres chiques, como costumava se referir o costureiro Denner, e que o cantor e compositor Eduardo Dussek redefiniu como dois grupos: o chique e o modelão. E na "Minha, Nossa Rua" tinha pessoas chiques. E não se tratava de terem ou não dinheiro ou largas e invejáveis contas bancárias. Por exemplo, o casal Protásio e Dalva Bernardes era extremamente chique. Os casais Nilo e Araci Graebin e o Arnaldo (que foi Secretário Municipal de Educação) e "dona" Dora também. O casal Osvaldo e Maria Theisen. A "dona" Gerda Wüttrock e a minha querida e saudosa e virginiana mãe.
Não havia "trem bala", era mesmo o "trem de ferro" ou "Maria Fumaça", com o fumacê exalando pela chaminé, deixando rastro no ar, mas as viagens, ainda que demoradas, eram muitíssimo mais confortáveis e emocionantes. Cenários cinematográficos, inexplorados, virgens, se descotinavam até o horizonte, enquanto num trôpego a Maria Fumaça subia a serra até chegar no ponto final, que era em Bento Gonçalves. Na "cidade alta" ficava o fim da linha.
Não havia o "telefone celular", apenas algumas poucas famílias podiam desfrutar do serviço telefônico que, para tantos, era um luxo, um exibicionismo, uma questão de status. Os demais tinham que ir até a Telefônica, no centro de Canoas, para mandar algum recado mais urgente. E assim mesmo, aguardavam horas na expectativa de conseguir a ligação feitas por jovens e até mesmo experientes senhoras telefonistas. Não havia a Internet, onde milhões de negócios são feitos em segundos sem a garantia da privacidade, mesmo assim, com todas aquelas dificuldades pela falta da tecnologia de hoje, fazia com que a vida fosse mais doce, mais bem vivida, mais bem curtida, apesar de mais árdua e dificultosa. Havia, em contrapartida, o calor humano, o sentimento de solidariedade, a parceria desinteressada,e o egoismo parece que inexistia. Uma quase confraria pautada pela amizade, pela parceria, muitas vezes, em forma de mutirão. Um sentimento uníssono e uma vivência de coletivo. O coletivo era a unidade. Hoje a unidade, em termos de vivência, é a individualidade extrema e desumanamente egoista.

Nem nos dávamos conta do quão emocionante era a vida que lavávamos, ainda que com um certo primitivismo.
A rua Frederico Guilherme Ludwig, como outras inúmeras ruas da época, entre os anos de 1956 a 1970, era de terra batida, daquela terra batida praticamente imprestável para até mesmo o plantio de algum pomar ou horta, e pior ficava com a adesão de cascalho (hoje brita) para minorar o problema do barro em dias de chuva, que nos obrigava, quando ir para o colégio, missa ou alguma festinha, a usar galocha de borracha para proteger os sapatos. As britas ou cascalho eram inimigos das galochas, pois as cortavam em pequenas fendas que, com o uso, iam alargando até não servir mais para o uso. Mas alí podíamos brincar e nos esbaldar de fazer guerra de barro, barro de um marron avermelhado. Haviam poucos carros que trafegavam pela "Minha, Nossa Rua", ainda mais porque a rua ficava, praticamente, fora de qualquer acesso de maior circulação. Não era nem mesmo uma rua de acesso a algum local importante ou de movimentação de gente. Apenas uma rua, uma especial rua, num quase bairro.


Mas o mais importante mesmo, ao lembrar desse tempo, era que ali na "Minha, Nossa Rua", antes de tudo isso, e sem desmerecer os amigos, eu tinha o meu pai e a minha mãe. Eu podia contar com eles a qualquer hora. Eram - e foram - as pessoas mais importantes, mais significativa, para mim e meus irmãos, com certeza, que havia na "Minha, Nossa Rua" e na nossa vida.
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